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sexta-feira, 11 de maio de 2012

Terra natal do Phearum


Depois de muitos convites para visitar a terra natal de um dos nossos funcionários, Phearum, eu e o Bart (outro intercambista em outra empresa do mesmo grupo) decidimos passar o último final-de-semana na vila Psa Trach, província de Kompong Chhnang, no interior do Camboja e cerca de 50 km de Phnom Penh. Foi uma experiência única pois pudemos ver com os nosso próprios olhos a vida do povo Khmer que não vive numa cidade grande como Phnom Penh

Desde que tomamos a decisão de ir, Phearum confirmava e reconfirmava o cronograma quase que diariamente além de sempre nos perguntar que tipo de comida gostaríamos de ter, onde gostaríamos de dormir, o que faríamos enquanto estivéssemos por lá, etc. A ansiedade dele era enorme e logo percebemos que não era apenas dele. A mãe dele já havia acertado tudo pra fazer os pratos preferidos meu e do Bart, Tchá Kadal e Lok Lak, respectivamente.

No sábado depois do trabalho almoçamos e daí seguimos pela estrada. Juntando-se à nós, a pessoa que me levou na garupa da moto era o amigo/primo do Phearum cujo nome se pronuncia como "Sei Lá". Era muito engraçado falar o nome dele sabendo o que significa pra gente no Brasil. Levamos um pouco mais de 1h para percorrer os 50 km de estrada asfaltada.

Casa do Phearum

A casa do Phearum é um terreno relativamente grande com duas construções, uma em que a família dele mora e a outra que foi erguida para ele vir um dia morar ali - atualmente usada como depósito de arroz. Na frente da casa, no mesmo terreno, opera um pequeno mercado em que os vendedores pagam um aluguel pelo espaço. A família dele também tem uma barraquinha virada diretamente para a estrada e eles também comercializam água tirada do próprio poço.

Mal chegamos e nos chamaram pra ver algo no quintal. Uma panela enorme de Tchá Kadal. Esse prato Khmer é feito de pedaços de carne ou frango ou fígado ou, no caso, pato, amendoim, vegetais e muuita pimenta. É muito bom! O Lok Lak é um misto de prato franco-Khmer em que pedaços de carne são fritos de forma rápida deixando a carne mal passada. É comum encontrar esse prato servido com ovo frito, arroz, alface, pepinos e muita cebola o que pra mim faz dele o mais parecido com comida brasileira.


Logo após isso Phearum e "Sei Lá" nos apresentaram pra família, pai, mãe, irmã, primos, etc. Começou daí também uma seção de fotografia não só porque nós começamos a tirar mas porque eles mesmos queriam que nós tirássemos fotos.

As sobrinhas dele nos chamaram a atenção. Sorriam abertamente e sem parar, sempre dando risada e andando as três juntas em "escadinha" da maior pra menor.



O "Sei Lá" recentemente foi admitido num concurso público pra virar fiscal de impostos na sua província natal, Pailin. Por causa disso, ele tinha acabado de ganhar o uniforme que ele passaria a usar nos próximos meses.

"Sei Lá" de uniforme, o mais alto Khmer que eu já conheci
Mais pessoas aparecem e logo vem a integrante mais nova da família. A pequena sobrinha do Phearum vem carregada pela irmã dele e logo todo mundo carrega ela no colo, inclusive eu e o Bart.


O nosso 2o almoço portanto estava na mesa às 3h da tarde. Não faltava nada, arroz, muito Tchá Kadal, muito Lok Lak, frutas e muita cerveja. Esse é o jeito Khmer de comemorar. Todos sentam em uma roda no chão. Daí cada um tem a sua cumbuca de arroz e os seus palitinhos chineses. Você vai então pescando aquilo que você quer. E isso dura horas, horas mesmo. Nosso 2o almoço emendou um jantar e durou até umas 20-21h da noite.


No Ocidente estamos acostumados em geral, principalmente em família, a uma festinha fechada com número certo de pessoas. No Camboja, dado que está ocorrendo algo especial, qualquer parente/amigo próximo pode se juntar. Basta que ele esteja passando por ali e você o convide - o que você faria pois é uma prática cultural e recíproca.

Outros pontos culturais interessantes eram: não se pode usar boné nem sapatos dentro de casa. Toda vez que você for beber é preciso brindar primeiro -Tchôul Muy. E eles têm uma lógica famosas quando estão bebendo, qualquer Khmer conhece essa frase: "Drink, drank, drunk. Drink not drunk, drink for what?"

Tio do Phearum que é do exército e lutou contra os tailandeses nos confrontos em 2010
Já mais a noite, outra leva de participantes, agora um outro primo que é policial, uma prima que tava doente e andava com um adesivo na testa, e um outro amigo que está tirando a foto.


Do nada entra a mãe do Phearum com mais um reforço de carne pra gente 'jantar'. Não paramos de comer nem beber o dia todo.

Nesse dia tinha chovido muito, aí tava cheio de siriri. Como estávamos sem energia elétrica e quando a gente ia urinar era ali no quintal mesmo não podia esquecer de levar a lanterna. Aí não tinha jeito, você era imediatamente envolvido em uma nuvem de insetos.


Depois disso ainda rodamos de moto na vila pra visitar alguns parentes e ainda ver se íamos dormir num outro lugar mas acabamos dormindo na casa do Phearum mesmo. Eu e o Bart dividimos uma cama típica deles, sem colchão apenas um tipo de estrado. Eles dormiram no chão mesmo apenas com um tapete embaixo.

Tror Leng Keng

No outro dia o mercado abriu por volta das 4-5h da madrugada. Aí fomos acordando com o barulho - e com as pessoas espiando pra ver quem éramos nós - até levantar mesmo por volta de 7h. Tomamos café da manhã e começamos o dia de passeios.

Essa era uma região que chegou a ser a capital do Camboja no século 19. Também foi a fronteira das guerras com os tailandeses. Porém tudo foi destruído e hoje não resta muita coisa além de pequenas estradas arborizadas, casas e plantações.


Então chegamos à Pagoda (templo) de Tror Leng Keng. No entorno desse lugar com duas construções para orações há um pequeno lago, muitas árvores e outros prédios de apoio à prática e educação budista. A sensação geral era de um lugar muito tranqüilo, me deu bastante sono.

Os templos eram repletos de pinturas. Dentro e fora, e, curiosamente com o preço em dólares de quanto custou a obra no canto de cada imagem. Imagens includem divindades budistas mas principalmente, me chamou atenção, a história do Camboja e dos conflitos com a Tailândia (Sião). Num dos quadros, Pheraum me explicou, é mostrado que o Camboja durante as batalhas perdeu o seu "deus Vaca", que representava riqueza, progresso, etc. E o deus Vaca foi levado para o Sião. Fato é que quando o Sião ocupou Angkor Wat e outros lugares do Império Khmer (antigo Camboja), intelectuais, artistas, tecnologia, símbolos de riqueza, etc., foram saqueados. E, desde então o Império Khmer entrou em decadência até virar protetorado da França.

Teto do templo
Uma outra figura interessante nesses templos são as 'monjas', chamadas Yeay Chi. Não entendo muito de budismo mas a atuação delas parece ser um pouco diferente dos monges. Elas ficam cuidando do templo, limpando e varrendo-o. Devem ter o cabelo raspado tanto quanto eles e aceitam doações em troca de orações.

Eu estava um pouco relutante em tirar a foto. Minha máquina não é discreta e normalmente pessoas envolvidas com religião não gostam de ser fotografadas. Nesse caso foi diferente. O Phearum me disse que ela já havia pré-autorizado eu a tirar fotos. Tentei entender o porquê e segundo ele era porque quando eu, estrangeiro, tiro fotos acabo divulgando o lugar e trazendo mais visitantes. Pois aqui estou, haha.

Monja posando pra foto
As duas construções que visitamos tinham coisas interessantes e em uma delas o altar era repleto de imagens, budas, etc.

Altar to templo budista
Udong Mountain

Terminada essa nossa visita fomos em direção à atração principal da região, a Phnom Udong, ou comumente conhecida como Udong Mountain. De 1618 até 1866 essa foi a capital do Camboja em resposta à invasão pelo Sião e após isso passou a ser Phnom Penh, permanecendo até hoje.

Há uma lenda interessante sobre esse lugar. No século 18, o imperador da China enviou emissários ao redor da Ásia de forma a descobrir possíveis ameaças ao seu império. Chegando ali, o emissário viu uma montanha em forma de uma cobra com várias cabeças (naga). Segundo ele o povo Khmer já era um povo forte e caso a cobra aparecesse em cima da montanha eles teriam o poder para dominar o mundo. O então imperador chinês não queria que isso acontecesse e nem uma guerra. Pediu então para que fosse construído um templo em que houvesse o rosto de Buda olhando para a China para que pudesse protegê-la. Fato é que o Camboja e a China sempre foram aliados desde sempre na realidade.

Outro ritual: ao subir as escadas é necessário dar esmolas, doações, etc. E isso deve ser feito com dinheiro pequeno e novo - em geral notas limpas de KHR 100 = $ 2.5 centavos de dólar.  Phearum então trocou uma nota de KHR 20.000 por um calhamaço dessas menores obviamente pagando uma comissão. Estrangeiros devem pagar US$1/pessoa para poder chegar nessa área. A cobrança é feita na estrada.

Escadaria da esmola
De longe é possível ver a 'montanha', que seria na verdade uma colina. São apenas 220 m de altura e lá de cima parece que você está no único prédio em uma planície sem fim. É possível ver tudo. As fotos panorâmicas abaixo tentam mostrar isso.


Olhando pro lado nordeste
Toda essa área marrom claro, são lugares onde é normalmente plantado arroz. Essa vista é da estação seca. Se tivéssemos vindo durante as chuvas (Mai-Out) teríamos visto um enorme espelho d'água mas provavelmente sem sol.

Olhando pro lado sudoeste
Ao redor do topo há uma série de construções que guardam estátuas sagradas de Buda entre outros aspectos religiosos. Isso faz com que haja uma quantidade enorme de monges circulando o tempo todo rezando e espirrando um tipo de perfume.

Monges rezando

O morro tem alguns diferentes 'picos', e em cada pico você pode encontrar outro lugar sagrado. templos, etc. Alguns foram inaugurados agora, em 2002, outros são de 1920, 1800, e até de 1600.

Olhando para Phnom Penh ao fudno
Aqui encontramos o templo que tem o rosto do Buda olhando pra China - não apenas a China.


Finalmente, num dos últimos picos pudemos ver o perfil de todos os templos.


Após isso nós descemos, tomamos uma ótima garapa por US$ 0.30 cada e voltamos pra casa do Phearum. Chegando lá tivemos um ótimo almoço, com muito peixe, arroz e frutas de sobremesa. Depois disso tivemos direto a um cochilo.

Antes que fôssemos embora porém tínhamos alguns presentes pra família do Phearum. Eu dei uma bandeira do Brasil e vários chaveirinhos pras crianças e pros adultos também. O Bart deu um pacote de doces.

Pai do Phearum, eu, Phearum, sua mãe, irmã e Bart
E assim, com mais outra viagem de 1h até Phnom Penh terminou essa nossa aventura de 1 final-de-semana pelo interior do Camboja. Foi uma experiência inesquecível e nos deixou em contato muito mais próximo com a realidade do povo local. Agradecemos imensamente ao Phearum e a sua família que nos receberam de braços abertos e nos trataram da melhor forma que eles podiam.

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2 comentários:

  1. Cara adorei seu blog. Me deparei com ele sem querer hoje zapeando pelo computador.
    Meu nome é Silvio Araujo e estou em Phnom Penh também tendo chegado hoje a tarde desde Siam Riep. Estou viajando pelo Sudoeste Asiático com um amiga - Virginia Scherer.
    Ambos no começo do ano pedimos demissão de nossos trabalhos e decidimos fazer uma viagem longa por essa parte do mundo. Já estamos na estrada a quase 2 meses. Pretendemos talvez mais dois meses antes de voltarmos para a realidade lá no Brasil.
    Foi otimo ler tudo o que escreveu, achei sua disposição em ver, aceitar, respeitar o local excelente, mesmo que isso as vezes seja completamente diferente de nossas realidades.
    Caso esteja ainda aqui pela Camboja adorariamos conhecê-lo e conversarmos um pouquinho sobre nossas experiências em nossa=o bom portugues. Um abraço

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  2. Fala Silvio, tudo bem? Fico muito feliz que você tenha gostado! Toma tempo haha mas eu tento passar pras pessoas as muitas diferentes coisas que vivenciei por aqui! Poxa que legal, espero que vcs estejam tendo uma ótima viagem! Podemos sim! vou te mandar um email e daí combinamos! abraçao!

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